3ª fase comentada

A Fase 3 é, em nossa Olimpíada, um
degrau a mais na escala de dificuldade. As questões ficam progressivamente mais
trabalhosas e exigem mais tempo de estudo. Foram 14 questões, e uma tarefa que,
neste caso, convidou os estudantes a analisarem em detalhe imagens de épocas e
de técnicas diferentes: um mapa, um quadro a óleo sobre tela e uma propaganda
de revista. Já havíamos realizado tarefas semelhantes nas Olimpíadas anteriores,
mas desta vez aumentamos um pouco a dificuldade, pois nem todas as frases
podiam ser associadas às imagens, sendo que as equipes deviam escolher as
frases que melhor descreviam o que viam.
21ª Questão
Basta pedir Modess
propaganda

Transcrição
Ela é moderna. Ela sabe viver. É
uma líder – nas ideias, no vestir, no viver. Em proteção higiênica, ela exige
Modess. Porque ela exige conforto e segurança em todos os dias do mês. Sua
maciez…uma absorvência sem igual e – mais que tudo – a higiene de Modess (usa-se
uma vez e joga-se fora) fazem-no indispensável. E o suficiente para um mês
custa menos que um vidrinho de esmalte. Basta pedir Modess. Produto da Johnson &
Johnson.
Sobre este documento
Título
Basta pedir Modess
Tipo de documento
propaganda
Palavras-chave
história das
mulherespropagandahistória dos costumes
Origem
Revistas de grande circulação, década
de 1950.
Escolha a alternativa mais pertinente:
Alternativas
A. A propaganda sugeria que com o
uso do produto acessível e moderno a mulher poderia ter maior controle sobre o
próprio corpo.
B. A propaganda indica que as
mulheres brasileiras na década de 1950 ainda resistiam a adotar hábitos de
higiene.
C. A propaganda contrapõe dois
tipos de mulheres: uma se diverte e anda de lambreta com um rapaz; a outra
parece olhá-la com inveja.
D. As propagandas do período são
indícios da diversificação e alteração de hábitos de consumo na década de 1950.
Comentário
A propaganda de absorvente
higiênico indica não apenas a adoção de novos hábitos de consumo no Brasil da
década de 1950 como associa a mulher realizada e livre para frequentar as ruas
como a usuária deste tipo de produto, descartável. Anteriormente, as mulheres
que, evidentemente, possuíam hábitos de higiene, utilizavam toalhas não
descartáveis, que tinham que ser lavadas e passadas, o que ligava o cuidado do
corpo ao trabalho doméstico. A contraposição com a mulher atrasada e pouco moderna
é intensificada pela imagem. A garota loira de cabelos curtos, dá adeus a
partir da garupa da lambreta, guiada por um rapaz, como que a deixar todas as
demais para trás; ou como que a dar adeus ao leitor da revista. A associação
entre ser moderna e utilizar o produto é imediata.
22ª Questão
Alvará de D. Maria I, Rainha de
Portugal, 5 de janeiro de 1785
documento legal
“Eu a Rainha faço saber aos que
este Alvará virem:
Que sendo-me presente o grande
número de Fábricas, e Manufaturas, que de alguns anos a esta parte se tem
difundido em diferentes Capitanias do Brasil, com grave prejuízo da Cultura, e
da Lavoura, e da exploração das Terras Minerais daquele vasto Continente; porque
havendo nele uma grande, e conhecida falta de População, é evidente, que quanto
mais se multiplicar o número dos Fabricantes, mais diminuirá o dos Cultivadores
e menos Braços haverá, que se possam empregar no descobrimento, e rompimento de
uma grande parte daqueles extensos Domínios, que ainda se acha inculta, e
desconhecida: Nem as Sesmarias, que formam outra considerável parte dos mesmos
Domínios, poderão prosperar, nem florescer por falta do benefício da Cultura, não
obstante ser esta a essencialíssima Condição, com que foram dadas aos
Proprietários delas e até nas mesmas Terras Minerais ficará cessada de todo, como
já tem consideravelmente diminuído a extração do Ouro, e Diamantes, tudo
procedido da falta de Braços, que devendo empregar-se nestes úteis, e
vantajosos trabalhos, ao contrário os deixam, e abandonam, ocupando-se em
outros totalmente diferentes, como são os da referidas Fábricas, e Manufaturas
e consistindo a verdadeira, e sólida riqueza nos Frutos, e Produções da Terra, as
quais somente se conseguem por meio de Colonos, e Cultivadores, e não de
Artistas, e Fabricantes e sendo além disto as Produções do Brasil as que fazem
todo o fundo, e base, não só das Permutações Mercantis, mas na Navegação, e do
Comércio entre os Meus Leais Vassalos Habitantes destes Reinos, e daqueles
Domínios, que devo animar, e sustentar em comum beneficio de uns, e outros, removendo
na sua origem os obstáculos, que lhe são prejudiciais, e nocivos em
consideração de tudo o referido Hei por bem Ordenar, que todas as Fabricas, Manufaturas,
ou Teares de Galões, de Tecidos, ou de Bordados de Ouro, e Prata: De Veludos, Brilhantes,
Cetins, Tafetás, ou de outra qualquer qualidade de Seda: De Belbutes, Chitas, Bombazinas,
Fustões, ou de outra qualquer qualidade de Fazenda de Algodão, ou de Linho, branca,
ou de cores: E de Panos, Baetas, Droquetes, Saetas, ou de outra qualquer
qualidade de Tecidos de Lã, ou os ditos Tecidos sejam fabricados de um só dos
referidos Gêneros, ou misturados, e tecidos uns com os outros; excetuando tão
somente aqueles dos ditos Teares, e Manufaturas, em que se tecem, ou
manufaturam Fazendas grossas de Algodão, que servem para o uso, e vestuário dos
Negros, para enfardar, e empacotar Fazendas, e para outros Ministérios
semelhantes; todas as mais sejam extintas, e abolidas em qualquer parte onde se
acharem nos Meus Domínios do Brasil, debaixo da Pena do perdimento, em
tresdobro, do valor de cada uma das ditas Manufaturas, ou Teares, e das
Fazendas, que nelas, ou neles houver, e que se acharem existentes, dois meses
depois da publicação deste; repartindo-se a dita Condenação metade a favor do
Denunciante, se o houver, e a outra metade pelos Oficiais, que fizerem as
Diligências; e não havendo Denunciante, tudo pertencerá aos mesmos Oficiais. (…)
Glossário
Alvará: Carta que contém a
vontade do soberano;
Sesmarias: Terra não cultivada ou
abandonada que os reis de Portugal concediam a determinados indivíduos para que
as cultivassem;
Belbutes: Tecido de algodão
aveludado;
Chitas: tecido de qualidade
inferior, feito de algodão e estampado em cores;
Bombazinas: Tecido de seda
primitivamente fabricado em Milão; tecido de algodão de riscas imitando veludo
e ordinariamente azulado;
Fustões: Tecido de algodão, linho,
seda ou lã em cordão mais ou menos grosso, apresenta relevos do lado direito;
Baetas: Pano de lã felpudo e que
não foi apisoado (comprimido em máquina chamada pisão);
Droquetes ou Droguetes: tecido de
qualidade inferior de lã, algodão e seda;
Saetas: Pano de lã fino
originário da Inglaterra e utilizado para forrar vestidos;
SILVA, Antonio Moraes. Diccionario
da lingua portugueza – recompilado dos vocabularios impressos ate agora, e
nesta segunda edição novamente emendado e muito acrescentado, por ANTONIO DE
MORAES SILVA. Lisboa: Typographia Lacerdina, 1813. Disponível em: http://www.brasiliana.usp.br/bbd/handle/1918/00299210
AULETE, Caldas. Diccionario
contemporaneo da lingua portugueza. Lisboa [Portugal]: Parceria Antonio Maria
Pereira, 1925, Disponível em: http://www.auletedigital.com.br/
BLUTEAU, Raphael. Vocabulario
portuguez & latino: aulico, anatomico, architectonico… Coimbra: Collegio
das Artes da Companhia de Jesus, 1712 – 1728. 8 v. Disponível em: http://www.ieb.usp.br/online/index.asp
Sobre este documento
Título
Alvará de D. Maria I, Rainha de
Portugal, 5 de janeiro de 1785
Tipo de documento
documento legal
Palavras-chave
história da industrializaçãoleis e
legislação
Origem
António Delgado da Silva (org.), Collecção
da Legislação Portugueza desde a última Compilação das Ordenações, Lisboa, Typografia
Maigrense, vol. III, 1775-1790, 1828, p. 370
Sobre o documento podemos dizer
que:
Alternativas
A. A proibição das manufaturas e
fábricas no Brasil é apontada como a solução para a concorrência que os
produtos brasileiros faziam com os portugueses no mercado externo.
B. A baixa densidade demográfica
na colônia e a necessidade de braços para a lavoura e para a mineração são
argumentos utilizados para justificar os atos impostos pelo Alvará.
C. Trata-se de um documento legal
pelo qual a Rainha de Portugal, D. Maria I, manda extinguir fábricas, oficinas
e manufaturas no Brasil, exceto as por ela determinadas.
D. A produção manufatureira e
fabril no Brasil é apresentada como uma ameaça ao equilíbrio e bom
funcionamento das relações comerciais no Império Português.
Comentário
O Alvará de 05 de Janeiro de 1785
é uma carta régia e, portanto, um documento legal. Por meio desse documento D. Maria
I proibiu e mandou extinguir as produções fabris no Brasil, utilizando como
argumentos: a necessidade de proteção da lavoura e da mineração, que perdiam
braços para as novas fábricas e manufaturas, o que num território tão vasto e
desproporcionalmente povoado era um grave problema. A necessidade de proteger
as relações comerciais entre as terras sob seu poder, nas quais as produções
agrícolas do Brasil eram fundamentais; a sua responsabilidade, enquanto rainha,
de zelar por todos os seus vassalos e defender da unidade do Império Português.
23ª questão
Membro de uma expedição francesa
no atual Maranhão, o padre capuchinho Claude d’Abbeville assim descreveu as
terras que visitou no ano de 1612:
História da missão dos padres
capuchinhos na ilha do Maranhão
relato de viajante
Texto adaptado
“Antes de falarmos dos costumes
dos povos do Maranhão e suas circunvizinhanças, creio que devo fazer em
primeiro lugar a descrição da dita Ilha, mormente quando nem a mencionam os
geógrafos que escrevem sobre o Brasil, e apenas tratam de um rio com esse nome,
o qual não se encontra em todo o país, a não tomarem eles a enseada ou Baía do Maranhão
por esse rio, ou por alguns outros que nela desembocam.
Não há razão, pois cada rio tem o
seu nome próprio como diremos ainda, e, além disso, com tal nome não conhecem
os Índios rio algum na sua terra, e sim uma Ilha, a que chamam Ilha Grande do Maranhão
(…)
(…)
Tudo (…) concorre para fortalecer
muito a Ilha Grande do Maranhão, além dos bancos, e recifes semeados por todos
os lados, e especialmente na foz da Baía, os quais a fazem inacessível não só
aos que não são bons Pilotos, ou não adquiriram experiência do canal pela
prática de muitas viagens, mas também a tornam de impossível entrada (…)
Além do Cabo das Tartarugas até
ao das Árvores Secas, todo esse espaço é formado de bancos e recifes, que
entram pelo mar adentro algumas vezes 4 ou 5 léguas, e até a 6, 7, 8 e 10
léguas, de maneira que ninguém pode aproximar-se de terra nem embarcado, nem a
nado, e nem a pé.
São também areias, bancos e
recifes o que existe entre os dois Cabos da Baía desta Ilha, e se não houver
grande experiência das duas únicas passagens, ali existentes, não há homem por
mais destemido, que seja, que se atreva a passar por esse lugar.
(…)
Por outro lado desde o Cabo de
Tapuytapera, próximo ao Maranhão, até o rio das Amazonas, há tantas Ilhas ao
longo da costa, que é impossível por ali chegar-se à terra firme, além de
estarem carregadas de certas árvores chamadas Mangues, que seus galhos deitam
muitos renovos ou olhos, os quais se estendem para baixo, tocam a terra e criam
raízes, donde se formam outras árvores, que fazem igual curso.
A criação e crescimento destas
árvores fazem com que se entrelacem muito umas nas outras, bem como suas raízes
também, de forma que se pode dizer haver em todas estas Ilhas uma só árvore e
uma só raiz.
Quando não houvesse outra coisa
mais, bastava só isto para torna-la impenetrável, e só vendo é que se pode
imaginar.
Ninguém pode atravessar estas
trincheiras, colocadas por Deus e mãe natureza ao redor desse país (…)
O ingresso ainda é mais difícil
nas Ilhas pequenas, e debaixo dos mangues, pois ali só existem coroas e areias
movediças, e nelas fica-se coberto até a cintura ou até o alto da cabeça, e uma
vez enterrado nelas não há poder algum de safar o sujeito de tais coroas.
A maré ou o reflexo do mar cobre
todos os dias, duas vezes, todas as coroas e areias, e passa por cima das
raízes dos mangues, erguidas além da superfície da terra em muitos lugares como
se fossem muralhas altas.
Se alguém pretender entrar deste país,
e quiser ir para a terra firme, convém entrar primeiro na Ilha Grande do
Maranhão (…) porque daí pode ir em canoas ou cascos até a foz dos rios no fundo
da Baía, depois ganhar a terra firme, e seguir para onde lhe aprouver.
Para chegar à Ilha Grande, só
existem duas entradas, uma entre o Cabo das árvores secas, e a Ilhazinha de
Santa Anna, a qual embora muito conhecida dos navegantes, nem todos se atrevem
a guiar um navio, e nem os próprios Pilotos, ainda mais os mais experientes, o
fazem com certeza ou pleno conhecimento.
Vi marinheiros muitos velhos (…) tremerem
15 dias antes da viagem, a que se pode chegar até a Ilha de Santa Anna(…)
Por outro lado podem entrar
navios de 1.000 à 1.200 toneladas e chegar até ao pé do Forte da Ilha Grande, porém
ainda o caminho não é muito conhecido, e é bem difícil.
Já se vê, que é tolice o pensar
expelir-se os Franceses destes lugares, quando neles bem estabelecidos, e
querer acreditar isto, além de procurar rebaixar assim a coragem deles, e
exaltar muito o valor e valentia dos contrários, é pura malícia, senão
temeridade, a menos que não se seja cego.
Os que viram a posição desta ilha,
e que por experiência conhecem a dificuldade de suas entradas não partilham tal
pensamento, gerado sem duvida em algum espírito tímido (…)”
Glossário
Renovo: Botão; broto; ramo novo
que nasce quando um galho é cortado; broto que origina outra planta;
Olhos: Broto; gema; protuberância
no caule da planta que dá origem a folhas, flores, ramos etc;
AULETE, Caldas. Diccionario
contemporaneo da lingua portugueza. Lisboa [Portugal]: Parceria Antonio Maria
Pereira, 1925, Disponível em: http://www.auletedigital.com.br/
Sobre este documento
Título
História da missão dos padres
capuchinhos na ilha do Maranhão
Tipo de documento
relato de viajante
Palavras-chave
Maranhãorelato de
viajanteformação do território nacional
Origem
Claude d’Abbeville. Historie de la mission des pères capucins en l’isle de
Maragnan et terres circonvoisines [1614]. História da Missão dos Padres
Capuchinhos na Ilhádo Maranhão e Terras Circumvizinhas. Traduzida e anotada por
Cezar Augusto Marques. Maranhão: 1874. Disponível em: http://www.archive.org/stream/histriadamissod00claugoog#page/n12/mode/2up
Créditos
Claude d’Abbeville.
Alternativas
A. Claude D’Abbeville descreve em
detalhes o território visitado, dando especial destaque à composição fluvial da
região, às rotas de acesso e às dificuldades de locomoção.
B. O mangue, vegetação
característica da região, é descrito pelo padre como trincheira que funcionava
tanto como proteção da região quanto como elemento que dificultava muito o
acesso à mesma.
C. A descrição tinha por objetivo
mapear a região ainda desconhecida por franceses e portugueses, e garantir um
melhor domínio na luta pela conquista de uma colônia francesa na América
Equatorial.
D. O relato demonstra que não
havia intenção do governo português em deter o avanço dos franceses naquela
região inóspita e de difícil acesso, o que facilitou o domínio francês por
décadas.
Comentário
Tendo viajado por quatro meses
pelo território da América Portuguesa e junto com uma expedição enviada ao
Maranhão, o padre capuchinho Claude D’Abbeville, ao retornar à França relata
suas impressões das terras e das gentes. Segundo o próprio viajante trata-se de
uma região ainda não mapeada pelos portugueses e assim descrevê-la com minúcias
se faz muito importante. Assim, detém sua descrição principalmente em aspectos
que permitam conhecer as rotas de acesso da região, cuidando para registrar o
nome de rios e ilhas e principalmente a dificuldade de acesso e de transporte. A
vegetação também ganha destaque em sua descrição, sendo apontada como mais um
elemento de dificuldade de acesso, uma vez que o mangue forma uma verdadeira
muralha natural entre as ilhas. Sua preocupação em descrever essas rotas e as
possibilidades de acesso à região condiz com a busca por orientar o
estabelecimento de uma colônia francesa na região, processo iniciado
timidamente alguns antes anos de sua visita. Termina sua descrição com a
certeza de que a presença francesa não seria motivo de disputa pela região o
que não se configura como real posto que a França Equinocial não se perpetuou
por mais de 3 anos.
24ª Questão
Anúncio de fuga de escravo
anúncio de jornal

Alternativas
A. O cartaz de “procura-se” nos
permite inferir que o escravo Fortunato sabia manipular referências culturais
da época (uso de sapatos e nome e sobrenome) para fazer-se passar por liberto.
B. Os anúncios de fugas de
escravos descreviam os aspectos físicos, trejeitos e as habilidades dos
procurados, fornecendo inúmeros detalhes que contribuíam na sua identificação.
C. O cartaz evidencia o
descumprimento dos direitos humanos, uma vez que limita sua liberdade e sua
possibilidade de oposição, resistência cultural e política.
D. O anúncio informa sobre a fuga
do escravo Fortunato e define a recompensa a ser paga caso ele fosse
reconduzido ao seu dono, um dos proprietários da tipografia Laemmert.
Comentário
O documento trata de um cartaz ou
anúncio sobre a fuga de um escravo de nome Fortunato por seu possível
proprietário Eduardo Laemmert. Nesse sentido, é fornecida uma detalhada
descrição dos aspectos físicos, de caráter e também funcionais do escravo
fugido, como forma de auxílio em seu reconhecimento, uma vez que o acesso a
imagens ou “retratos falados” era limitado na época. O que é interessante notar
é o alerta que o anúncio nos traz ao afirmar que o escravo se utilizava de
alguns subterfúgios para enganar as pessoas e continuar em sua fuga: “costuma
às vezes andar calçado intitulando-se forro”; ou seja, a presença ou ausência
de sapatos nos pés de um negro é um símbolo cultural que o identifica como
forro ou liberto, sendo “manipulado” pelo escravo Fortunato em sua busca por
liberdade. Por fim, não se pode afirmar que o cartaz ferisse algum aspecto dos
“direitos humanos” primeiro porque o escravo, dentro da cultura escravocrata, era
considerado um bem e como tal era regido pela legislação voltada à propriedade
privada (Constituição de 1824 e Ordenações Filipinas); segundo porque a idéia
de “direitos humanos” é um conceito jurídico recente da qual as pessoas que
participavam da instituição da escravidão não compartilhavam, sendo, portanto, um
anacronismo conceitual.
25ª Questão
O diabo do feitiço
artigo de revista
“Quando viu aquele embrulho suspeito na
porteira do curral do capitão Carlos de Oliveira em Vila Real do Senhor Bom
Jesus do Cuiabá, o preto alforriado Joaquim Moreira achou por bem averiguar o
que havia ali dentro. Encontrou, entre outros objetos, pedaços de couro, corais,
uma argola de ferro, versos de uma oração e até mesmo alguns bicos de pássaros,
tudo isso envolvido por um lenço de tabaco. Pensando ser feitiçaria, Joaquim
ateou fogo naquelas coisas. Contrariado, o escravo Manoel Quiçamá, autor do
embrulho, foi tomar satisfação, afirmando que “aquilo não era feitiço, mas
remédio para curar os outros de feitiço”.
As práticas de feitiçaria e magia
faziam parte do diaadia dos habitantes da região do Mato Grosso no século XVIII.
Casos como o de Joaquim Moreira e uma série de denúncias sobre práticas de
adivinhadores, rezadores, curadores e feiticeiros podem ser encontrados nos
Autos da Devassa da Visita Geral da Comarca Eclesiástica de Cuiabá, realizada
em 1785. Apesar de o Tribunal do Santo Ofício – braço da Igreja responsável
pelo julgamento de crimes religiosos – não ter se estabelecido no Brasil, seus
representantes realizaram sete importantes visitas, além de outras de menor
impacto.
Os números da Devassa, que
significa “investigação”, revelam aspectos muito interessantes sobre as
acusações. Das 15 denúncias de prática de magia, 12 foram feitas por brancos. Em
relação às acusações de feitiçaria, temos uma proporção próxima: das 48
acusações, 30 foram feitas por brancos. Seguindo a mesma lógica, das 15 pessoas
acusadas por magia, apenas seis eram brancas. Além disso, entre os supostos
feiticeiros não havia sequer um branco. O grande número de denúncias de magia e
feitiçaria feitas por brancos mostra como eles acreditavam que negros e índios
usavam estas práticas nos conflitos cotidianos.
(…)
Mergulhar no fascinante e
misterioso universo da feitiçaria no Mato Grosso do século XVIII nos permite
ampliar os horizontes da história do período. Mas resta uma pergunta: o saldo
de suas práticas trouxe aos feiticeiros mais conquistas ou perdas? Mesmo
perseguidos e denunciados, muitos escravos conseguiram, graças a supostos dons
sobrenaturais, afrouxar os grilhões e renegociar sua condição.”
Sobre este documento
Título
O diabo do feitiço
Tipo de documento
artigo de revista
Palavras-chave
história da escravidãohistória
das religiõesséc. XVIII
Origem
Mario Teixeira de Sá Junior. “O
diabo do feitiço”, RHBN, 01/01/2010. Disponível em: http://www.revistadehistoria.com.br/v2/home/?go=detalhe&id=2852
Créditos
Mario Teixeira de Sá Junior.
A partir da leitura do texto, assinale
a alternativa mais pertinente.
Alternativas
A. A ausência do Tribunal do
Santo Ofício no Brasil permitiu que acusações que geravam punições severas na
Europa ficassem impunes em solo brasileiro.
B. A magia é apresentada no texto
como um meio de negros e índios exercerem certa resistência cotidiana diante
dos desmandos da sociedade na qual viviam.
C. Os autos da Devassa mostram
que o imaginário sobre a prática da magia era compartilhado na sociedade
colonial entre negros, índios e brancos.
D. Joaquim Moreira não conseguiu,
apenas olhando o conteúdo do embrulho, diferenciar entre feitiço e remédio para
curar feitiço.
Comentário
O texto de Mário Teixeira de Sá
Júnior nos apresenta um amplo leque sobre a presença da feitiçaria nos
distintos períodos da história brasileira, valorizando os relatos e documentos
provenientes da região do Mato Grosso. Negros, índios e brancos compartilhavam
desse imaginário, embora cada grupo étnico possa ter exercido sua crença mágica
conforme seus ritos e interesses. O que importa sinalizar nesse diálogo
cultural é a dinâmica social viabilizada por essa crença, registrado nesse
texto de Sá Júnior pelos autos da Devassa, a partir da qual ficam explícitos os
costumes religiosos cotidianos da sociedade colonial brasileira, assim como as
estratégias de resistência de negros e índios mediante tais ditames. Dessa
forma, a expressão “herdeiros do feitiço”, conforme sugere o historiador, não
representa uma característica negativa para a nossa época, mas aparece como uma
proposta de historicidade à recorrência de muitas pessoas hoje em resolver seus
problemas habituais através da magia.
26º Questão
O bom museu
artigo de jornal
“Conhecemos instituições de
internamento: o asilo, o hospital, a prisão, a escola, o quartel. Ora, o museu
as reúne todas: de fato, parece uma escola, por sua vontade didática e suas
preocupações historicistas; evoca a prisão, com suas vigilâncias, barreiras, proibições,
sem contar o silêncio e os longos corredores; assemelha-se ao hospital ou ao
asilo, porque recolhe restos mais ou menos deteriorados, salvos do desastre ou
do tempo e, aliás, tratados em consequência (múltiplos cuidados: desinfecção, próteses
e restaurações consolidantes): é uma escola, uma prisão, um hospital”.
Esse é um trecho de “Le Musée
sans Fin” (O Museu sem Fim, ed. Champ Vallon, 1982), escrito por François
Dagognet, ele próprio bom leitor de Michel Foucault. Local disciplinar e
repressivo, em que as obras são confinadas e os espectadores adestrados segundo
normas rígidas de comportamento, o museu também é um lugar de crença e de
espetáculo. A crença no valor espiritual das artes faz dele uma solene catedral
laica. Os limites da visibilidade, dispostos pelos curadores e diretores, transforma-o
num cenário. As decisões, o domínio, a manipulação, situam-se nas coxias. Sobre
o público, massa passiva e menosprezada, derramam-se escolhas misteriosas, indiscutíveis.
El supremo
A velha ideia do intelectual
diante da vanguarda das massas nasceu no Iluminismo e reforçou-se com certas
concepções marxistas. Tem hoje seu refúgio no diretor ou no conservador de
museus. É ele quem decreta quais obras o público deve ver, quais vão para as
reservas. Esse poder chega às raias da paranoia. Os grandes museus
internacionais permitem, pelo menos aos estudiosos, acesso fácil ao acervo
conservado em reserva. Mas em outros, o pesquisador encontra tropeços e portas
fechadas. É então a via-crúcis dos pedidos negados, das cartas não respondidas,
dos arbitrários: “Esta não”, “aquele não pode”. É o gostinho prazeroso do mando:
todas as razões se resumem a “porque eu não quero”.
Libertação
Em 1937, Le Corbusier propôs o
projeto de um museu de arte moderna em que as reservas seriam abertas ao
público. [A arquiteta] Andrée Putman criou, para o museu de Rouen, na França, uma
formidável apresentação, incluindo as reservas no percurso do espectador. São
poucos os exemplos de soluções assim democráticas. Ocorreu no Museu D. João 6º,
da Universidade Federal do Rio de Janeiro, uma renovação espantosa, coordenada
pela professora Sonia Gomes. Sua coleção preciosa, admirável, vinculada à
Escola Nacional de Belas Artes desde seus antigos primórdios, está exposta em
totalidade, afora as obras mais frágeis, como os papéis.
Ideia perfeita: salas de
exposição concebidas como reservas. Que não se imagine, no entanto, a assepsia
sem graça comum nesses lugares. A museografia de Marize Malta, sensível, pensou
as cores com cuidado, dispôs obras nas paredes e nos painéis que o visitante
deve, ele próprio, manipular para trazê-las à exposição. Não é um recinto
técnico: é um lugar lindo, e de prazer. O visitante não o percorre apenas: fica
e não tem mais vontade de ir embora.
Inédito
Todos os diretores de museus
brasileiros deveriam fazer uma peregrinação ao D. João 6º. Para inspirarem-se
em suas soluções e, sobretudo, em seu espírito. Muitos decerto invocariam razões
práticas para continuarem autoritários. Os obstáculos são, porém, mentais, e
não concretos. Outros aproveitariam. Fica longe, no Fundão, prédio da Reitoria.
Mas quem não foi, faça um esforço e vá, para se regalar.
Glossário
Curador (CURADORIA): designação
genérica do processo de concepção, organização e montagem da exposição pública.
Inclui todos os passos necessários à exposição de um acervo, quais sejam
conceituação, documentação e seleção de acervo, produção de textos, publicações
e planejamento da disposição física dos objetos. Refere-se também ao cargo ou
função exercida por aquele que é responsável por zelar pelo acervo de um museu.
Fonte: http://www.revistamuseu.com.br/glossario/pop_glos.asp?id=850
Sobre este documento
Título
O bom museu
Tipo de documento
artigo de jornal
Palavras-chave
ensino de HistóriaMuseu
Origem
Jorge Coli, O bom museu, Jorge
Coli, Folha de São Paulo, 07/Mar/2010: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mais/fs0703201002.htm
Créditos
Jorge Coli.
A partir da leitura do artigo de
Jorge Coli, assinale a alternativa mais pertinente.
Alternativas
A. As reservas fazem parte do
acervo de um museu, ainda que não sejam expostas ao público e tenham seu acesso
restrito.
B. O museu é um lugar de disputas,
no qual a curadoria cria seu próprio discurso cultural ao selecionar as obras
de arte que serão expostas.
C. O museu é apresentado pelo
artigo como um lugar de prazer, em que a arte e os documentos perdem seu valor
por conta de seus manuseios pelo o público visitante.
D. O texto defende uma ideia
inovadora de museu que, diferente de um espaço disciplinador, deveria interagir
com o seu público visitante e proporcionar a ele uma atividade de lazer.
Comentário
O objetivo dessa questão sobre a
organização de um museu é perceber nesse espaço, que agrega objetos com valores
artísticos e históricos, a representação de um discurso. A forma como está
exposto o acervo do museu, lembrando que existem inúmeros documentos guardados
e não disponibilizados aos visitantes (as chamadas “reservas” e que são, geralmente,
restritas ao público e em alguns casos até aos pesquisadores), desenha uma
visão da curadoria do museu. Nesse sentido, o artigo de Jorge Coli defende o
museu como um espaço de interatividade, em que o público deveria se sentir
parte atuante e constitutiva dos referenciais do museu, podendo interferir em
quais objetos gostaria de ver expostos.
27ª Questão
Alunos da escola Darci Vargas
fotografia
Documento da 3ª Fase

Alunos da escola Darci Vargas, São
Carlos, Relatório da Delegacia Regional de São Carlos, 1942. Arquivo do Estado
de São Paulo
Sobre este documento
Título
Alunos da escola Darci Vargas
Tipo de documento
fotografia
Palavras-chave
história da educaçãoséc. XXGoverno
Vargas
Origem
Alunos da escola Darci Vargas, São
Carlos, Relatório da Delegacia Regional de São Carlos, 1942. Arquivo do Estado
de São Paulo. Disponível em: http://www.arquivoestado.sp.gov.br/educacao/galeria_det.php?cidade=S%E3o%20Carlos
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Cartaz com imagem de Getúlio
Vargas
cartaz

No cartaz, também visualizado ao
fundo com a imagem de Getúlio Vargas está escrito:
“As leis sociais com que o atual
governo, por iniciativa própria tem procurado amparar as classes trabalhadoras
devem constituir motivo de orgulho para os brasileiros.”
Sobre este documento
Título
Cartaz com imagem de Getúlio
Vargas
Tipo de documento
cartaz
Palavras-chave
história da educaçãoséc. XXGoverno
Vargas
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Vargas
Cartaz com imagem de Getúlio
Vargas
cartaz
história da educaçãoséc. XXGoverno
Vargas
Alternativas
A. A disposição da cena - postura
das crianças e da professora, o uniforme escolar, as imagens ao fundo - nos
permite inferir que a disciplina e o patriotismo eram conceitos importantes
para a educação do período.
B. A fotografia apresenta uma
classe escolar disposta organizadamente ao ar livre, composta por meninos e
meninas que estão em torno da professora e, ao fundo, a imagem de Getúlio
Vargas e da bandeira do Brasil.
C. As escolas particulares eram
mais patrióticas do que as escolas públicas, pois como mostra a fotografia, primavam
pelo uso obrigatório do uniforme e pela referência aos símbolos nacionais.
D. A exaltação às leis de amparo
ao trabalhador, presente no texto do cartaz, faz alusão à Reforma Capanema, a
qual institui o ensino profissionalizante no país.
Comentário
A questão convidava a equipe a
observar às imagens e identificar: que a fotografia retrata uma turma da escola
Darci Vargas, localizada em São Carlos – SP, pertencente à rede privada de
ensino; que os meninos e meninas estavam dispostos de forma organizada, ao ar
livre, em trono da professora – no centro da imagem. No muro, ao fundo, destaca-se
um cartaz com a face do Presidente Getúlio Vargas (nosso segundo documento) ao
lado da bandeira do Brasil. A observação das imagens possibilitava perceber, por
meio da postura das crianças e da professora, do uniforme escolar, do cartaz e
da bandeira ao fundo, que a disciplina e o patriotismo eram importantes para a
educação do período. Ao observar a legenda contida no cartaz é possível
associar o tema do trabalho à cena escolar, pois a Reforma Capanema, responsável
pela instituição do ensino profissionalizante no país, foi impetrada na década
de 1940.
28ª questão
Leia o texto do cronista
português Fernão Lopes de Castanheda que relatou a partida do vice-rei
Francisco de Almeida em uma grande armada portuguesa que se dirigia de Lisboa à
Índia, em 1505.
História do descobrimento e
conquista da Índia pelos portugueses
crônica
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História do descobrimento e
conquista da Índia pelos portugueses
crônica
Documento da 3ª Fase
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“Foi o rei à sua nau para o ver
partir cuidando que fosse aquele dia sua partida (e não foi por ser o tempo
contrário) para isso. E assim durou até vinte e cinco de março sem nunca
segurar para se a frota poder partir. E neste tempo se perdeu a nau de Pero
d’Anhaia (…) e abonançado o tempo o governador se partiu de Belém a vinte e
cinco de março de mil e quinhentos e cinco [1505], e El Rei foi por mar a velo
partir, e esteve até ver [partir] a frota que se desamarrou, com grandes gritas
e estrondos de toda sua artilharia e assim da torre [de Belém]. E indo esta
frota pelo rio abaixo, mandando aos pilotos do leme que governassem a bombordo,
e estibordo, como se costuma quando saem de algum rio, embaraçavam-se os
marinheiros por não serem ainda versados naqueles vocábulos, principalmente os
da caravela de João Homem, e quando havia de governar a bombordo que é da mão
direita, governavam a estibordo que é a esquerda: o que vendo João Homem disse
ao piloto que falasse aos marinheiros por vocábulos que eles sabiam: e quando
quisesse que governassem a estibordo que dissesse alhos, e quando a bombordo
cebolas: e a cada banda mandou pendurar uma réstia destas coisas; e como o
piloto falou por aqueles vocábulos se não embaraçaram mais os marinheiros e
governaram direito”
Sobre este documento
Título
História do descobrimento e
conquista da Índia pelos portugueses
Tipo de documento
crônica
Palavras-chave
grandes navegaçõesséc. XVIdescobrimento
Origem
Fernão Lopes de Castanheda. História
do descobrimento e conquista da Índia pelos portugueses. Porto: Lello e Irmãos,
1979, vol. 2, p 211 apud Paulo Miceli. O ponto onde estamos. Campinas: Ed. da
Unicamp, [1994] 2008 pp. 87-88.
Créditos
Fernão Lopes de Castanheda.
Alternativas
A. A crônica evidencia o pouco
conhecimento náutico que os marinheiros possuíam em “governar” as naus, uma vez
que foi necessário substituir “bombordo e estibordo” por “alhos e cebolas”.
B. A descrição dos efetivos
realizadores das Grandes Navegações nesse texto contrasta com outros relatos
que retratam os portugueses como heróis dotados de profundo conhecimento
náutico.
C. O texto relata a celebração da
partida de uma frota de caravelas portuguesas rumo à Índia no contexto das
Grandes Navegações, que inclui a conquista do território da América Portuguesa,
cuja partida é acompanhada pelo rei, pela população e por um cortejo marcial na
foz do rio Tejo.
D. O conhecimento náutico e suas
técnicas descritos no texto seguiam uma ampla tradição partilhada entre os capitães
das caravelas e seus subordinados na Escola de Sagres.
Comentário
O texto do cronista Fernão Lopes
de Castanheda relata a partida de uma expedição marítima portuguesa saindo de
Lisboa rumo à Índia no contexto das Grandes Navegações. Tal evento é
acompanhado pelo rei português e pela população na região da foz do rio Tejo, em
que são realizados um cortejo marcial com direito a tiros de canhão e muita
algazarra. Além disso, a crônica evidencia o pouco conhecimento técnico naval
que muitos dos participantes dessas longas viagens possuíam, tal como atesta o
desconhecimento das expressões “bombordo/estibordo” pelos marinheiros na nau de
João Homem. Isso evidencia certa contradição e uma ironia crítica por parte do
cronista que, apesar de demonstrar a heroicidade portuguesa em se “lançar ao
mar”, também deixa transparecer a fragilidade dessa aventura e dos
conhecimentos partilhados nesse processo. Por fim, é incorreto afirmar que
havia uma rígida tradição de conhecimentos partilhados entre os superiores e os
subordinados, pois enquanto uns conheciam a linguagem náutica, as técnicas de
navegação e cartografia, outros não passavam de simples camponeses aventureiros,
entendendo mais de “alhos e cebolas” que de “bombordo e estibordo”.
29ª questão
Pontos de Jongo
letra de música
Documento da 3ª Fase
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Ponto de Jongo 01
“Eu tava dormindo, cangoma me chamou
Levanta povo que o cativeiro já acabou.”
Ponto de Jongo 02
“Eu pisei na pedra a pedra balanceou
Mundo tava torto, rainha endireitou,
Eu pisei na pedra a pedra balanceou
Mundo tava torto, rainha endireitou.”
Ponto de Jongo 03
“Treze de maio a corrente arrebentou,
No dia treze de maio a corrente arrebentou.”
Ponto de Jongo 04
“No tempo do cativeiro
Aturava muito desaforo
Levantava de manhã cedo
Com cara limpa levo o couro, ai
Agora quero ver o cidadão
Que grita no alto do morro
Vai-se Cristo, seu moço
Seu negro agora tá forro”
Glossário
Cangoma: (n.b angoma, o tambor maior, de tronco escavado e
de um couro só, usado no jongo/caxambu).
Silvia Hunold Lara; Gustavo Pacheco (orgs). Memórias do
Jongo. As gravações históricas de Stanley J. Stein, Vassouras, 1949. Rio de
Janeiro: Folha Seca; Campinas, SP: CECULT, 2007.
Sobre este documento
Título
Pontos de Jongo
Tipo de documento
letra de música
Palavras-chave
cultura popularhistória da escravidãoséc. XIX
Origem
Silvia Hunold Lara; Gustavo Pacheco (orgs). Memórias do
Jongo. As gravações históricas de Stanley J. Stein, Vassouras, 1949. Rio de
Janeiro: Folha Seca; Campinas, SP: CECULT, 2007
Alternativas
A. O desaparecimento do jongo e a
inexistência de jongueiros nos dias atuais implicou uma grande perda para a
pesquisa histórica e para a cultura nacional.
B. Os pontos de jongo
apresentados fazem referência, respectivamente, ao momento em que os escravos
recebem a notícia do fim da escravidão; à atuação da princesa Isabel; ao fim do
cativeiro; e à nova condição de homens livres.
C. Embora os jongos sejam
frequentemente improvisados em função das circunstâncias do momento, o acervo
de expressões e outros recursos estilísticos baseiam-se em uma tradição
coletiva.
D. O uso de metáforas, palavras e
expressões de origem africana dificultava a compreensão dos pontos pelos não-escravos
e permitia que o jongo fosse usado como uma crônica da vida no cativeiro.
Comentário
Os pontos selecionados fazem
referência ao momento específico da assinatura da Lei Áurea pela princesa
Isabel e a forma como os escravos perceberam este ato. Destacamos, também, que
o uso de metáforas, palavras e expressões de origem africana, dificultava a
compreensão dos pontos pelos não-escravos e permitia que o Jongo fosse usado
pelos escravos como uma forma de crônica da vida no cativeiro baseando-se fortemente
numa tradição coletiva.
Por fim, vale lembrar que até os
anos 1980, grande parte da bibliografia sobre a escravidão privilegiou uma
análise mais sistêmica dos aspectos econômicos e sociais, insistindo na
violência da dominação escrava e da história do capitalismo no Brasil. Os
escravos eram considerados mercadorias, seres destituídos de vontade própria, incapazes
de atitudes políticas – e por isso deixavam de fazer parte da história, a não
ser para nela figurar como números nas análises sobre o tráfico, ou como
capital investido nas análises econômicas. Quando a historiografia inverteu
essa perspectiva, as abordagens sobre a vida nas fazendas, nas quais os
testemunhos dos escravos e seus descendentes são fartamente utilizados tornam-se
comuns e as práticas como a do Jongo despontaram como importante fonte para o
estudo da experiência escrava.
30ª Questão
Capitães da Areia - O Trapiche
trecho de texto literário
Documento da 3ª Fase
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O Trapiche
Sob a lua, num velho trapiche
abandonado, as crianças dormem.
Antigamente aqui era o mar. Nas
grandes e negras pedras dos alicerces do trapiche as ondas ora se rebentavam
fragorosas, ora vinham bater mansamente. A água passava por baixo da ponte sob
a qual muitas crianças repousam agora, iluminadas por uma réstia amarela de lua.
Desta ponte saíram inúmeros veleiros carregados, alguns eram enormes e pintados
de estranhas cores, para a aventura das travessias marítimas. Aqui vinham
encher os porões e atracavam nesta ponte de tábuas, hoje comidas. Antigamente
diante do trapiche se estendia o mistério do mar-oceano, as noites diante dele
eram de um verde escuro, quase negras, daquela cor misteriosa que é a cor do
mar à noite.
Hoje a noite é alva em frente ao
trapiche. É que na sua frente se estende agora o areal do cais do porto. Por
baixo da ponte não há mais rumor de ondas. A areia invadiu tudo, fez o mar
recuar de muitos metros. Aos poucos, lentamente, a areia foi conquistando a
frente do trapiche. Não mais atracaram na sua ponte os veleiros que iam partir
carregados. Não mais trabalharam ali os negros musculosos que vieram da
escravatura. Não mais cantou na velha ponte uma canção um marinheiro nostálgico.
A areia se estendeu muito alva em frente ao trapiche. E nunca mais encheram de
fardos, de sacos, de caixões, o imenso casarão. Ficou abandonado em meio ao
areal, mancha negra na brancura do cais.
Durante anos foi povoado
exclusivamente pelos ratos que os atravessavam em corridas brincalhonas, que
roíam a madeira das portas monumentais, que o habitavam como senhores
exclusivos. Em certa época um cachorro vagabundo o procurou como refugio contra
o vento e contra a chuva. Na primeira noite não dormiu, ocupado em despedaçar
ratos que passavam na sua frente. Dormiu depois algumas noites, ladrando à lua
pela madrugada, pois grande parte do teto já ruíra e os raios da lua penetravam
livremente, iluminando o assoalho de tabuas grossas. Mas aquele era um cachorro
sem pouso certo e cedo partiu em busca de outra pousada, o escuro de uma porta,
o vão de uma ponte, o corpo quente de uma cadela. E os ratos voltaram a dominar
até que os Capitães da Areia lançaram suas vistas para o casarão abandonado.
Neste tempo a porta caíra para um
lado e um do grupo, certo dia em que passeava na extensão dos seus domínios (porque
toda a zona do areal do cais, como, aliás, toda a cidade da Bahia, pertence aos
Capitães da Areia), entrou no trapiche.
Seria bem melhor dormida que a pura
areia, que as pontes dos demais trapiches onde por vezes a água subia tanto que
ameaçava levá-los. E desde esta noite uma grande parte dos Capitães da Areia
dormia no velho trapiche abandonado, em companhia dos ratos, sob a lua amarela.
Na frente, a vastidão da areia, uma brancura sem fim. Ao longe, o mar que
arrebentava no cais. Pela porta viam as luzes dos navios que entravam e saíam. Pelo
teto viam o céu de estrelas, a lua que os iluminava.
Logo depois transferiram para o
trapiche o depósito dos objetos que o trabalho do dia lhes proporcionava. Estranhas
coisas entraram então para o trapiche. Não mais estranhas, porém, que aqueles
meninos, moleques de todas as cores e de idades as mais variadas, desde os 9
aos 16 anos, que à noite se estendiam pelo assoalho e por debaixo da ponte e
dormiam, indiferentes à chuva que muitas vezes os lavava, mas com os olhos
puxados para as luzes dos navios, com os ouvidos presos às canções que vinham
das embarcações…
É aqui também que mora o chefe
dos Capitães da Areia: Pedro Bala. Desde cedo foi chamado assim, desde seus
cinco anos. Hoje tem 15 anos. Nunca soube de sua mãe, seu pai morrera de um
balaço. Ele ficou sozinho e empregou anos em conhecer a cidade. Hoje sabe de
todas as ruas e de todos os seus becos. Não há venda, quitanda, botequim que
ele não conheça. Quando se incorporou aos Capitães da Areia (o cais
recém–construído atraiu para as suas areias todas as crianças abandonadas da
cidade) o chefe era Raimundo, o Caboclo, mulato avermelhado e forte.
Não durou muito na chefia o
caboclo Raimundo. Pedro Bala era muito mais ativo, sabia planejar os trabalhos,
sabia tratar com os outros, trazia nos olhos e na voz a autoridade de chefe. Um
dia brigaram. A desgraça de Raimundo foi puxar uma navalha e cortar o rosto de Pedro,
um talho que ficou para o resto da vida. Os outros se meteram e como Pedro
estava desarmado deram razão a ele e ficaram esperando a revanche, que não
tardou. Uma noite, quando Raimundo quis surrar Barandão, Pedro tomou as dores
do negrinho e rolaram na luta mais sensacional a que as areias do cais jamais
assistiram. Raimundo era mais alto e mais velho. Porém Pedro Bala, o cabelo
loiro voando, a cicatriz vermelha no rosto, era de uma agilidade espantosa e
desde esse dia Raimundo deixou não só a chefia dos Capitães da Areia, como o
próprio areal. Engajou tempos depois num navio.
Todos reconheceram os direitos de
Pedro Bala à chefia, e foi desta época que a cidade começou a ouvir falar nos
Capitães da Areia, crianças abandonadas que viviam do furto. Nunca ninguém
soube o número exato de meninos que assim viviam. Eram bem uns cem e destes
mais de quarenta dormiam nas ruínas de um velho trapiche.
Vestidos de farrapos, sujos, semi-esfomeados,
agressivos, soltando palavrões e fumando pontas de cigarro, eram, em verdade, os
donos da cidade, os que a conheciam totalmente, os que totalmente a amavam, os
seus poetas.”
Glossário:
Trapiche: casa ou depósito onde
se guardam gêneros de embarque à borda do mar; armazém em que são guardadas
mercadorias importadas ou destinadas à exportação;
AULETE, Caldas. Diccionario
contemporaneo da lingua portugueza. Lisboa [Portugal]: Parceria Antonio Maria
Pereira, 1925, Disponível em: http://www.auletedigital.com.br/
Sobre este documento
Título
Capitães da Areia - O Trapiche
Tipo de documento
trecho de texto literário
Palavras-chave
Literaturaséc. XX
Origem
Jorge Amado. Capitães da Areia. 83
ed. Rio de Janeiro: Record, 1996 [1936], p. 19-21.
Créditos
Jorge Amado.
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Trailer do filme "Capitães
da Areia"
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Fundação Casa de Jorge Amado
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originais - "Capitães da
Areia"
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Alternativas
A. Os menores abandonados vivendo
nas condições insalubres descritas no texto demonstram a existência de uma
sociedade desigual.
B. O texto descreve o processo de
abandono do trapiche e do casarão que, no passado foram cenários de intensa
atividade econômica, e de ocupação destes espaços pelos Capitães da Areia.
C. A pobreza e a agressividade
das crianças que dormiam no casarão e habitavam o trapiche eram fruto de suas
escolhas e não um problema social.
D. A afirmação de que os Capitães
da Areia eram os donos da cidade e perseguidos pela polícia permite perceber a
contradição na qual vivia o grupo: integrava-se ao seu espaço físico, mas vivia
a sua margem.
Comentário
Num primeiro momento, o autor
mostra como o Trapiche era parte fundamental da intensa atividade econômica que
ocorria no cais do porto de Salvador, descrevendo as inúmeras trocas comerciais
que ali se realizavam e as embarcações que traziam e levavam uma variedade de
produtos a serem consumidos e transportados. Mostra, ainda, como o fim desta
dinâmica deixou o trapiche obsoleto tornando-o alvo de ratos e cachorros, mais
tarde, a referência de lar dos menores abandonados agregados em torno dos
Capitães da Areia. É no trapiche onde se abrigam, escondem-se e vivem como
família. Ali constroem suas próprias regras, são seus senhores. O grupo de
menores abandonados denominados Capitães da Areia traz em comum a pobreza, a
vida insalubre, uma vaga revolta contra o mundo hostil, marcas de uma sociedade
desigual.
Os menores vivem a liberdade que
encontram nas ruas, a lealdade grupal e se relacionam com a cidade de forma
bastante ambígua. Ao mesmo tempo em que conhecem a cidade como poucos e se
relacionam com representantes de alguns grupos de importância na cidade, (como
por exemplo, o padre e a mãe de santo), são marginalizados pela força policial
sempre a sua espreita. Por fim, Capitães da Areia é uma obra que nos convida a
problematizar a pobreza no Brasil a partir da situação dos menores abandonados
e perceber que se trata de um problema social.
31ª Questão
O direito de ser africano livre
trecho de texto acadêmico
“A categoria legal de ‘africanos
livres’ não foi uma criação da lei de 1831. Ela teve origem nos tratados
bilaterais assinados por Portugal com a Grã-Bretanha para a abolição do tráfico
de escravos. Entre os procedimentos para a repressão do tráfico, estava a
criação de comissões mistas dos dois lados do Atlântico, que julgariam os
navios apreendidos. Na convenção adicional de 1817, estabeleceu-se que os
africanos encontrados a bordo dos navios condenados por tráfico ilegal seriam
emancipados e ficariam sob tutela do governo do país onde o navio havia sido
julgado. A exemplo da legislação aplicada nos domínios britânicos desde 1808, o
alvará português de 26 de janeiro de 1818 determinou que, durante o período de 14
anos, os africanos emancipados seriam preparados para o ‘trabalho livre’. Os
‘africanos livres’ no Brasil possuíam status jurídico semelhante ao de pessoas
livres sob tutela e submetidas a trabalho compulsório e partilhavam essa
condição com grupos emancipados nos domínios coloniais britânicos, espanhóis e
holandeses. Com base nos acordos bilaterais de 1817 e 1826, na lei de 1831 e na
Lei Eusébio de Queirós, de 1850, foram emancipados aproximadamente 11 mil
africanos no Brasil. Ao contrário do que determinava a lei de 1831, os
africanos não foram enviados de volta à África. Esses homens, mulheres e
crianças cumpriram o período de serviço obrigatório distribuídos entre
concessionários particulares e instituições públicas no Rio de Janeiro e nas
províncias do Império. Foram sempre tratados pelo governo imperial como
compondo uma categoria especial, distinta dos escravos e libertos.
A lei de 1831, geralmente
rotulada como sendo ‘para inglês ver’, merece atenção mais detalhada. Sabemos, pelas
investigações mais recentes, que ela serviu à repressão do tráfico ilegal, especialmente
nos primeiros anos de sua vigência. Depois disso, nos anos conturbados da
consolidação do Estado Imperial, o governo brasileiro deixou para os britânicos
a função de repressão ao tráfico de escravos e abriu mão de aplicá-la, facilitando
o crescimento vertiginoso do contrabando. A repressão efetiva só foi retomada
em 1850, apoiada na Lei Eusébio de Queirós. Ainda assim, a lei de 7 de novembro
de 1831, no seu primeiro artigo, decretava livres todos os africanos
introduzidos no território nacional a partir daquela data (…)”
Sobre este documento
Título
O direito de ser africano livre
Tipo de documento
trecho de texto acadêmico
Palavras-chave
leis e legislaçãohistória da
escravidãoséc. XIXhistória do direito
Origem
Beatriz Gallotti Mamigonian. “O
direito de ser africano livre”. LARA, Silvia Hunold e MENDONÇA, Joseli Maria
Nunes. Direitos e Justiças no Brasil. Campinas: Editora da Unicamp, 2006, p.131-132.
Créditos
Beatriz Gallotti Mamigonian.
Escolha a alternativa mais
pertinente:
Alternativas
A. A lei de 1831 só passou a ser
efetivamente exercida quando os proprietários dos navios negreiros apresados
começaram a ser indenizados pelo governo britânico, por suas perdas financeiras.
B. O rótulo “lei para inglês ver”
atribuído à lei de 1831 acabou por construir uma leitura simplista da efetiva
importância dessa lei para o processo de emancipação dos escravos no Brasil.
C. A proibição do tráfico
atlântico de escravos inscrita nas leis de 1831 e de 1850 é fruto de uma série
de acordos iniciados, desde a segunda década do século XIX, entre Brasil e Grã-Bretanha.
D. O rótulo “lei para inglês ver”
atribuído à lei de 1831 se deve a pouca atuação efetiva do governo brasileiro -
mais preocupado com a consolidação política do Império - em reprimir o tráfico
de escravos.
Comentário
Essa questão tinha como objetivo
propor às equipes uma reflexão sobre a lei de 7 de novembro de 1831, percebendo
que a sua caracterização como uma “lei para inglês ver” é dada por uma
historiografia que se concentrou na pouca atuação do governo para reprimir o
tráfico e apresar os navios negreiros – função deixada aos ingleses enquanto o
Brasil voltava sua preocupação para consolidação política do novo sistema de
governo. Tal seleção acabou por impedir uma reflexão mais aproximada da
importância dessa lei para o processo de emancipação escrava. Em seu texto, Beatriz
Mamigonian demonstra que a proibição do tráfico atlântico de escravos foi fruto
de um processo de negociações e de acordos bilaterais iniciados nas primeiras
décadas do século XIX, entre o Brasil e a Grã-Bretanha. Por fim, não há
registros históricos de que o governo britânico indenizava aos proprietários de
navios negreiros.
32ª Questão
Ainda sobre o texto de Beatriz
Gallotti Mamigonian:
O direito de ser africano livre
trecho de texto acadêmico
Documento da 3ª Fase
Ver todos os documentos
“A categoria legal de ‘africanos
livres’ não foi uma criação da lei de 1831. Ela teve origem nos tratados
bilaterais assinados por Portugal com a Grã-Bretanha para a abolição do tráfico
de escravos. Entre os procedimentos para a repressão do tráfico, estava a
criação de comissões mistas dos dois lados do Atlântico, que julgariam os
navios apreendidos. Na convenção adicional de 1817, estabeleceu-se que os
africanos encontrados a bordo dos navios condenados por tráfico ilegal seriam
emancipados e ficariam sob tutela do governo do país onde o navio havia sido
julgado. A exemplo da legislação aplicada nos domínios britânicos desde 1808, o
alvará português de 26 de janeiro de 1818 determinou que, durante o período de 14
anos, os africanos emancipados seriam preparados para o ‘trabalho livre’. Os
‘africanos livres’ no Brasil possuíam status jurídico semelhante ao de pessoas
livres sob tutela e submetidas a trabalho compulsório e partilhavam essa
condição com grupos emancipados nos domínios coloniais britânicos, espanhóis e
holandeses. Com base nos acordos bilaterais de 1817 e 1826, na lei de 1831 e na
Lei Eusébio de Queirós, de 1850, foram emancipados aproximadamente 11 mil
africanos no Brasil. Ao contrário do que determinava a lei de 1831, os
africanos não foram enviados de volta à África. Esses homens, mulheres e
crianças cumpriram o período de serviço obrigatório distribuídos entre
concessionários particulares e instituições públicas no Rio de Janeiro e nas
províncias do Império. Foram sempre tratados pelo governo imperial como
compondo uma categoria especial, distinta dos escravos e libertos.
A lei de 1831, geralmente
rotulada como sendo ‘para inglês ver’, merece atenção mais detalhada. Sabemos, pelas
investigações mais recentes, que ela serviu à repressão do tráfico ilegal, especialmente
nos primeiros anos de sua vigência. Depois disso, nos anos conturbados da
consolidação do Estado Imperial, o governo brasileiro deixou para os britânicos
a função de repressão ao tráfico de escravos e abriu mão de aplicá-la, facilitando
o crescimento vertiginoso do contrabando. A repressão efetiva só foi retomada
em 1850, apoiada na Lei Eusébio de Queirós. Ainda assim, a lei de 7 de novembro
de 1831, no seu primeiro artigo, decretava livres todos os africanos
introduzidos no território nacional a partir daquela data (…)”
Sobre este documento
Título
O direito de ser africano livre
Tipo de documento
trecho de texto acadêmico
Palavras-chave
leis e legislaçãohistória da
escravidãoséc. XIXhistória do direito
Origem
Beatriz Gallotti Mamigonian. “O
direito de ser africano livre”. LARA, Silvia Hunold e MENDONÇA, Joseli Maria
Nunes. Direitos e Justiças no Brasil. Campinas: Editora da Unicamp, 2006, p.131-132.
Créditos
Beatriz Gallotti Mamigonian.
Alternativas
A. Os “africanos livres” ao
contrário do que determinava a lei de 1831 não retornavam à África, sendo
distribuídos no Rio de Janeiro e nas províncias do Império para a prestação do
tempo de serviço determinado.
B. A lei de 1831 garantiu a um
grande número de indivíduos o direito de ser “africano livre”, direito que
seria acionado constantemente nos tribunais na segunda metade do século XIX, por
defensores dos escravos como Luiz Gama.
C. Ser “africano livre” colocava
os indivíduos encontrados em navios negreiros apresados em uma nova categoria
jurídica: não eram escravos nem libertos, uma vez que estavam sujeitos à tutela
e ao trabalho compulsório.
D. Após 1831, os africanos
trazidos ilegalmente para o Brasil ficaram conhecidos como meia-caras, formando
um grupo diferente dos chamados “africanos livres”.
Comentário
Nessa segunda questão era
esperado que as equipes observassem as implicações legais do ser “africano
livre” no Brasil do século XIX. Essa categoria legal colocava milhares de
indivíduos em uma condição jurídica diversa daquela do escravo e do liberto: como
tutelados e obrigados ao trabalho compulsório como forma de serem preparados
para o “trabalho livre”, esses indivíduos eram conhecidos como “meia-cara”. A
Lei de 1831, assim como os acordos bilaterais e a lei de 1850, garantiu a
efetiva liberdade de milhares de escravos na primeira metade do século XIX, mas
não garantiu o retorno dos mesmos à África como a própria lei previa. Devemos
lembrar ainda que o direito de ser “africano livre” foi acionado nos tribunais
brasileiros da segunda metade do XIX, onde indivíduos como Luiz Gama lutaram
pela liberdade de outros milhares de escravos entrados ilegalmente no país
entre 1831 e 1850, fazendo da Lei Feijó uma verdadeira arma na luta pela
liberdade.
33ª Questão
Trabalho, lar e botequim
trecho de texto acadêmico
“Trata-se, simplesmente, de
‘estranhar’, num caminhar atento pela cidade: que muitas pessoas peçam esmolas,
que outras dêem esmolas; que muitas pessoas equilibrem suas casas nas encostas
dos morros, que outras estejam solidamente instaladas aqui embaixo; que muitas
das pessoas penduradas nas encostas tenham a pele de cor escura, que as daqui
de baixo sejam quase todas de pele branca; e assim por diante, indefinidamente.
Trata-se, simplesmente, de tentar entender como e por que coisas e pessoas se
fizeram assim, e não de qualquer outra forma. (…) Gostaria de argumentar (…) que
a história serve, em última instância, para complicar a vida. Ou seja, ao
explorar sistematicamente o “estranhamento” inicial, o historiador cria
condições para a percepção do real como construção, como ‘invenção’ de seres
humanos concretos em processo de interação e luta entre si. Em outras palavras,
a história nos instiga a pensar o social – passado, presente e futuro – como
processo tecido na contradição e na luta, e não como ‘anestesia’, como
‘mesmice’. “
Sobre este documento
Título
Trabalho, lar e botequim
Tipo de documento
trecho de texto acadêmico
Palavras-chave
historiografia
Origem
Sidney Chalhoub. Trabalho, lar e
botequim. São Paulo: Brasiliense, 1986, p. 232.
Créditos
Sidney Chalhoub.
Alternativas
A. O historiador busca a
complexidade do que vê e compreende o processo histórico como um processo
contraditório de interação e de tensões entre seres humanos concretos que vivem
em sociedade.
B. O historiador, em seu objetivo
de “complicar” - muito mais do que de explicar –, falseia o passado para
libertar-se da mesmice.
C. A pobreza associada à cor da
pele e à distribuição social no espaço do Rio de Janeiro são indícios de
desigualdade social que o historiador estranha e busca explicar.
D. Ao observar e estranhar seu
presente, o historiador busca no passado as explicações para o modo como coisas
e pessoas tornaram-se o que são.
Comentário
Nesta questão, o objetivo era
produzir a reflexão da equipe sobre o ofício do historiador e a forma como ele
observa o presente e projeta seu olhar sobre o passado. No trecho de Sidney
Chalhoub, encontramos vários aspectos desse modo de observar o passado a partir
de inquietações postas pelo presente, numa busca por explicações que ajudam a
minimizar o estranhamento causado pelo mundo que o cerca; nessa busca, o
processo histórico apresenta-se como algo complexo e permeado de contradições e
tensões, que trazem à tona seres reais, que viveram e atuaram historicamente, construindo
a sociedade. Um exemplo disso é própria organização da cidade do Rio de Janeiro
apresentada por Chalhoub e a separação de classes a partir da cor da pele, que
acaba por revelar uma desigualdade social que não pode ser explicada de forma
simples. Nesse processo de observação e de busca por uma visão que se passou, o
historiador percebe que o “real” é uma construção, matizada por diversos
aspectos; ainda que ilusório, esse “real” é constituído por personagens de
carne e osso, por indivíduos que viveram e participaram do processo histórico. Essa
forma de olhar o passado é um processo complexo, que não busca a simplicidade
ou o real, mas sim uma interpretação do social com suas tensões e nuanças.
34ª Questão
Cabrião
gravura publicada em jornal

Legendas:
À esquerda: – Não tens medo do
recrutamento? – Qual medo! eu arranjei uma cartinha de recommendação para o
Chefe… e estou ninando…
À Direita:
Não póde dizer o mesmo este
mizeravel, que não tem padrinho, e por isso, além de recrutado, ainda recebe
uma soffrivel tunda!!!
Glossário
Tunda: sova, grande quantidade de
pancadas.
AULETE, Caldas. Diccionario
contemporaneo da lingua portugueza. Lisboa [Portugal]: Parceria Antonio Maria
Pereira, 1925, Disponível em: http://www.auletedigital.com.br/
Sobre este documento
Título
Cabrião
Tipo de documento
gravura publicada em jornal
Palavras-chave
história militarséc. XIX
Origem
Cabrião, n. 30, 28 de abril de 1867.
Disponível: http://www.brasiliana.usp.br/bbd/handle/1918/060025-30#page/4/mode/1up
Créditos
Ângelo Agostini.
Documentos relacionados
Para saber mais, veja estes
documentos abaixo:
Edições de Cabrião
links
A gravura do semanário Cabrião
diz respeito ao recrutamento para a Guerra do Paraguai. A partir dela podemos
afirmar que:
Alternativas
A. Embora o corpo de soldados se
chamasse Voluntários da Pátria, assim como ocorreu no período colonial, os
indivíduos eram recrutados contra a sua vontade.
B. O método de recrutamento
representado nas imagens sugere que existia uma alternativa para fugir da
guerra, que variava segundo a posição socioeconômica dos indivíduos, caracterizada
também pelas vestimentas.
C. O método de recrutamento
baseava-se na voluntariedade da população masculina estimada em 4,9 milhões em 1865,
sobretudo, dos africanos entrados ilegalmente no país, libertos e considerados
“escravos da Nação”.
D. O número de brasileiros
mobilizados para a Guerra foi calculado entre 135 e 200 mil, contando com
africanos entrados ilegalmente no país; o Exército foi se consolidando no
decorrer do conflito.
Comentário
Em 1865, a população masculina
estimada era de 4,9 milhões e calcula-se que foram enviados entre 135 e 200 mil
soldados à Guerra do Paraguai. Grande parte dos soldados enviados para a o
front formavam o grupo dos chamados “Voluntários da Pátria”, porém, o método de
recrutamento continuou sendo forçado como no período colonial. Senhores de
escravos cederam cativos e uma lei de 1866 concedeu liberdade aos “escravos da
Nação” que servissem ao Exército. Esta lei se referia aos africanos trazidos
ilegalmente para o país. Na imagem apresentada o artista Angelo Agostini
ironiza não apenas o recrutamento forçado, como também a possibilidade que uma
pequena parcela da população tem de escapar dele, dependendo para isso de suas
relações pessoais, do apadrinhamento.
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